sexta-feira, 10 de julho de 2009

a palavra inexistente

por Cristina Thomé

Um encontro havia sido marcado. Nele, latente a possibilidade de falar sobre dores internas, ouvir um pouco do que ia no coração da outra pessoa. Coisas difíceis, delicadas. O sentimento era grande. Disso ela sabia. Havia um dia inteiro até lá, que passou atarefado e acabou com chuva, numa reunião de trabalho com pessoas que se conheciam há muito tempo.

Sentia-se cansada. Uma canseira que não era propriamente física. Como se fosse mais funda, coisa de alma velha. Aqui nada de comparar com sabedoria. Pode ser alma velha e burra mesmo. Têm das duas coisas. A chuva lhe ajudou a chegar numa profunda calma ao encontro marcado.

Sinceramente esperava um pouco de diálogo sobre coisas que aconteceram antes e durante um comprido distanciamento. Saber da outra pessoa. O que teria feito nos últimos tempos, o que pensava, o que ia pela cabeça. Talvez nem falar quisesse tanto. Nada de conclusões, no final das contas. Porque essas coisas são sem lógica e não acontecem assim.

Logo de cara, o encontro que seria entre duas pessoas acabou em três. Nada contra a terceira pessoa, simpaticíssima aliás. Mas, estranhamente, aquilo que era importante parecia já não ser importante, ou pelo menos não tão importante assim. Um sentimento de vazio.

As duas pessoas do encontro previamente marcado eram bastante diferentes. Uma gostava de gente, o tempo todo. A outra gostava de gente, mas não em tempo integral. Cada uma delas com traços marcantes, porém em sentidos diversos. Não diria opostos. Paralelos, talvez.

Hábitos bem diferentes. Uma com acentuado gosto boêmio, a outra que via na noite uma bela oportunidade de sono. Nada aqui de considerar certos e errados, apenas diferenças. Isso vingaria? Haveria respeito para equilibrar dicotomias?

Não apostaria nessa noite. Não por acreditar ou por não acreditar, simplesmente por não saber. Algumas palavras foram ditas, algumas vontades lançadas. E assim foi, a noite e a chuva, duas pessoas dormindo juntas. Quem sabe no sono o encontro aconteceu?

A manhã veio. Café, pão, ovo quente, três pessoas falando do tempo ao redor da mesa. A chuva lá fora. As duas pessoas do encontro marcado se separam. Pode ter sido a reinvenção de um novo começo. Pode ser que nada houvesse a ser dito. Ela de fato não sabia.
 

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