sábado, 4 de julho de 2009

noite


por Cristina Thomé [03/07/2009]

À espreita, o olho do bicho ruim. Era nítido o brilho no negrume. Estava lá se deslocando na sombra. Fedia aquilo. De dentro da casa podia se sentir o pesado do ar. Em algum canto a coisa nojenta media.

E, mataria quem passasse. Os da casa sabiam que essa hora não era mais a de sair. A noite exigia recolhimento. Há anos era assim. Começou repentino. Foram sumindo pessoas, sobrava sangue na palhada. Cavalo que, na teimosia, por ali fosse conduzido, estacava, refugava, não ia. Era caminho de volta, à disparada.

O tempo corria e o cheiro fétido se instalava. O estalado do mato, o brilho no escuro e a indelével presença do bicho ruim que dali não saía. Noite após noite, sem se importar com a lua.

Encomendaram novena. Ignorância desmedida. Chamar Deus pra bicho do demônio resultou em três beatos a menos na noite da procissão. Restou santo de gesso encostado ali, sem devoto pra carregar no lombo a fé que não existia.

Investidas várias pra matar o desconhecido. Semanas passaram, meses passaram. Tentativas foram minguando, rareando foi a vontade. Nada se via.

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